Katerina. Porque persistes a brincar comigo?
- Porque essa é a essência de quem eu sou. Uma aberração. Não pertenço a você. Nunca pertenci. Eu fui prometida ao inferno antes mesmo de nascer. Eu não faço parte da Totentanz.

Ninguém escapa da Dança da Morte. Ela é inevitável.

- Eu não escapei. Eu a recebi e a escorracei. Eu não pertenço aos mortos.

E aqueles aos quais transformou?

- Eles são meus. Você não pode tocá-los.

Katerina. Continuará a brincar?

Kat suspirou, frustrada.

- Vocês não tem alguém para buscar?

Kat sabia que estava vendo nada mais nada menos que os últimos restos mortais das 20 mil bruxas mortas bem em frente ao seus olhos. Só conseguia pensar na maldição. 
Última badalada.
As Crônicas de Kat. Danse Macabre. Giulia Santana. 2013.
De todas as forças existentes no universo a mais poderosa se chama Morte. Todo mundo morre. Tudo chega ao fim. E apesar de ser completamente inevitável, ela é a força que as pessoas mais tentam evitar. Todo mundo conhece seres místicos imortais: bruxas, vampiros, lobisomens, fadas, espíritos e humanos diversos dando uma de espertinhos pra escapar da Morte. Claro que "ela" sempre dá um golpe de volta, deixando essas criaturas com fraquezas ridículas (quer dizer, madeira? prata? sério?).
Claro que a ideia de fim está tão presa em nossa cabeça, que nem mesmo imaginamos de verdade a ideia de viver pra sempre. Não sei se sou a única, mas quando eu penso na palavra "imortal" eu penso no passado, ao invés de o futuro. Imagino pessoas que passaram por fases que a gente já conhece como a idade média, a idade moderna, o século XIX que vivem nos dias de hoje também. Pensar no futuro, na ideia de conhecer essas milhares de coisas à frente é muito esquisito, porque eu penso em um fim, um fim inevitável. E muita gente concorda com isso. E por isso que mesmo muito antes de seres imortais "aparecerem" no mundo, a Morte já era honrada com poesia, música, drama, pintura e arquitetura em um movimento artístico chamado Danse Macabre.
Dança macabra (no original Danse Macabre), é uma alegoria artístico-literária do final da Idade Média sobre a universalidade da morte, que expressa a ideia de que não importa o estatuto de uma pessoa em vida, a dança da morte une a todos.
Wikipédia: Danse Macabre
As primeiras representações da Morte, surgiram na França, com peças teatrais onde a personificação dessa força surgiam para buscar a todos, desde o mais rico nos reis, até o mais humilde dos bebês. Mas a primeira Danse importante foi o poema/afresco no Cemitério dos Santos Inocentes em Paris. O afresco foi destruído no século XVII e não existem fotos disponíveis na internet. No entanto, o poema que lá ficava foi publicado com uma gravura:

O ato


O creature roysonnable
Qui desires vie eternelle.
Tu as cy doctrine notable:
Pour bien finer vie mortelle.
La dance macabre sappelle:
Que chascun a danser apprant.
A homme et femme est naturelle,
Mort nespargne petit ne grant.
En ce miroer chascun peut lire
Qui le conuient ainsi danser.
Saige est celuy qui bien si mire.
Le mort le vif fait auancer.
Tu vois les plus grans commancer
Car il nest nul que mort ne fieret
Cest piteuse chose y panser.
Tout est forgie dune matiere.
Ó criatura racional
Que deseja a vida eterna.
Aqui está ensinamento notável:
Para todos a vida é mortal.
Dança macabra se chama
A dança que cada um irá dançar.
Ao homem e à mulher é natural,
A pena da morte é pequena.
Como cada um pode ver
A dança que se aproxima.
Cego é aquele que se esconde.
A morte é brilhante atacante.
E você a ver maior ao se aproximar
Porque não se afasta da morte.
E esta coisa lamentável não vai curar.
É sempre da mesma maneira.¹

O sucesso dessa Danse foi puramente uma coincidência feliz, mas essa primeira atenção dada à Morte introduziu todo um movimento, a respeito da dita cuja. Uma das influencias que deram continuação a esse movimento, naturalmente, foi a Peste Negra já que ela assolou todos da população, desde os mais pobres, até os reis dos maiores reinos da época. Ou seja, se você teme a alguma coisa, mostre respeito a ela em forma de arte e faça sucesso.
A maior Danse de todas ficava em Lübeck, Alemanha e foi desenhada de forma a lembrar uma enorme (era uma pintura de cerca de 30 metros quadrados) história em quadrinhos, onde cada um dos 24 personagens - organizados numa hierarquia que ia do Papa a um bebê - levados pelos representantes da Morte, dizia uma fala, sobre sua própria história. A pintura de 1463, foi substituída por uma cópia renovada, com um novo texto em 1701, mas a mesma foi destruída durante a Segunda Guerra Mundial. No entanto existe uma pintura muito semelhante em Tallinn, Estonia, que tem o texto original medieval:


É estranhamente irônico o fato de que mesmo as maiores representações da Morte caíram por terra, ao ponto de desaparecer. É como se ela repetisse, mesmo através da destruição de suas homenagens, sua mensagem principal: TUDO É FINITO. TUDO É MORTAL.
G.


Fontes:

¹ Adaptação para a língua portuguesa por Giulia Santana.